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Turismo nas aldeias traz autonomia aos povos indígenas, afirma liderança


Por Leandro Altheman


A liderança Yawanawá, Joaquim Tasha, rebateu os aspectos sensacionalistas da matéria publicada na manhã desta quarta, 27, pelo site AC 24 horas. Matéria expõe de maneira preconceituosa aspectos negativos do crescente turismo nas aldeias acreanas.


‘Em primeiro lugar essa manteria é maldosa, a fonte não entende nada de indigenismo ou do mundo indígena. Esse tipo de mentalidade não contribui para nada. Se ela realmente acha que os recursos estão mais atrapalhando do que ajudando porque ela não chamou nenhuma liderança para conversar? Porque o dinheiro é como a tecnologia, ele constrói coisas belas e destrói coisas belas.’, respondeu por mensagem de áudio pelo whats app Joaquim Tashkã.


A liderança indígena da aldeia Mutum do povo yawanawá enviou os áudios ao jornalista Altino Machado. Altino gentilmente cedeu os áudios e Tashkã autorizou sua utilização para a matéria de resposta.


O texto publicado a partir de uma fonte anônima faz uma série de acusações que têm como alvo, o turismo nas aldeias acreanas, atividade econômica em franco crescimento no estado.


A principal ‘acusação’ é de que os ‘gringos’ estariam trazendo dinheiro e drogas para as aldeias e busca associar a esse cenário, o uso da ayahuasca, bebida de uso tradicional dos povos indígenas acreanos.


‘Não é vergonha tomar a ayahuasca, o uni (como os yawanawá denominam a ayahuasca) é conhecimento imemorial, um conhecimento intrínseco que liga nosso caminho com nossa espiritualidade. Hoje há interesse da ciência em compreender essa bebida. Nossos conhecimentos (tradicional e científico) estão se encontrando. Quem toma com respeito tem muito a aprender.’, disse.


A reportagem critica a ‘introdução do capitalismo nas aldeias’. Segundo a fonte: “O capitalismo que era coisa da cidade entrou nas aldeias de tal forma que eles não pensam em outra coisa a não ser as cerimonias de captar recursos que não é a benefício de todos, mas de ‘alguns’ líderes”, acrescentou.


A afirmação é falsa. Os yawanawá fazem parte do ‘sistema capitalista’ desde pelo menos o início do século XX com ciclo da borracha e seguem mantendo relações econômicas com os brancos desde então.

A grande diferença é que, a partir do turismo, os yawanawá passaram a ter maior autonomia nas relações econômicas, o que parece incomodar setores que antes viviam da tutela sobre os índios. Ou talvez, daqueles que tenham planos de introduzir outros modelos de economia que rivalizam com o turismo, tais como: exploração madeireira, gado, soja e mineração.


‘Povos indígenas têm que ter sua autonomia sua autodeterminação e decidir o que é bom para eles e que não é bom para eles. Estamos cansado de pessoas dizerem para gente como deve ser.’ Em outro áudio, completa: ‘ Isso parece matéria encomendada por alguém que não respeita a auto determinação dos povos indígenas.’


Mesmo reconhecendo que possam haver problemas decorrentes do impacto do turismo, Tashkã aponta que os benefícios têm sido maiores.


‘Não quero dizer que esteja tudo certo, somos humanos, as comunidades vêm aprendendo, vêm construindo seu projeto de vida. Mas os yawanawá não estão aleatórios, desorganizados bagunçados. Estamos trabalhando dentro de uma governança própria.’


‘Hoje o povo yawanawá tem uma vida melhor de uma experiência pioneira trabalhando com projetos sócio-econômico cultural e espiritual sem depender nada de governo. Tudo é conseguido pelo próprio trabalho de nosso povo. Hoje os yawanawá vivem independente de FUNAI e independente de governo. Não enxergar isso é ser muito burro.’


A relação entre turismo e espiritualidade na Amazônia vem sendo tema de debates desde os anos 90. Por mais que se olhe com ressalva a busca de estrangeiros e nacionais por vivências nas aldeias, pesquisadores traçam paralelos entre esse movimento e o turismo religioso ou peregrinação, quase tão antigos quanto a própria humanidade. O ‘turismo sacro’ ao Santuário de Nossa Senhora de Aparecida levou em 2018 cerca de 12 milhões de pessoas. Independente destes serem classificados como ‘turistas ou peregrinos’, movimentam milhões de reais na cidade de Aparecida do Norte.

O interesse dos evangélicos em Israel tem tornado o país do Oriente Médio um dos destinos preferidos dos brasileiros, sempre com ênfase no aspecto religioso. Poderíamos ainda citar a peregrinação anual dos muçulmanos à Meca, o caminho de Santiago da Compostela e mesmo a visita a locais como Stonehenge ou Machu Picchu, também estão carregados de caráter espiritual explícito ou implícito.

O fato de povos indígenas colocarem o Acre, um estado isolado e com poucas alternativas na rota internacional do turismo deveria ser visto antes como um benefício do que como um problema.


‘As pessoas pensam que temos que prover tudo de graça. O mundo usa desenho, medicina de origem indígena sem pagar nada. Ela acha que é imoral os povos indígenas receberem pelo serviço que faz? Vai na China fazer um serviço de massagem ou acupuntura? Vai para qualquer lugar do mundo. Em todo mundo é assim, nada mais que justo receber pelo que se faz.’


Por fim, Tashkã faz um convite à fonte misteriosa usada pelo site para atacar a atividade econômica dos indígenas: ‘Convido com o maior carinho para sentar comigo para explicar para ela como funciona a governança yawanawá’.

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