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Redes sociais e Comunicação Política.

Por Ermício Sena

“Se conseguirmos nos desprender das velhas fórmulas de comunicar, é o começo de uma alternativa”

Esses dias de isolamento estão sendo bons para refletir sobre o alcance das redes sociais no mundo pandêmico.

Tenho me interessado em estudar o quanto o WhatsApp, YouTube, Facebook, Instagram, etc. são importantes para a comunicação política e o entendimento que temos da atual política local e nacional.

Faço isso tudo dialogando com o Projeto de Pesquisa que coordeno na UFAC: “Redes sociais e Comunicação Política”.

A primeira constatação com a qual tenho me deparado são com opiniões sobre a disputa que se trava com a sociedade tanto do lado da ignorância e do radicalismo quanto do lado da democracia e do pluralismo das ideias.

O antagonismo ou impossibilidade de convivência entre essas categorias, tão bem relacionada em “Como as democracias morrem”, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, estão muito presentes no cenário político nacional e o Estado autoritário e de excessão proposto por Jair Bolsonaro.

E como chegamos até aqui?

Parece ter se tornado um mantra que o atual cenário tem sua origem na criminalização da política, que começou com o movimento difuso que ocorreu a partir de 2013 e foi ganhando contornos antidemocráticos, que perduram até hoje.

Isso não parece ser novidade, mas o que talvez possa ser um achado de futuros estudos é a letargia, a ingenuidade e o descompromisso com a democracia que se percebe em muitos que deveriam estar fazendo essa disputa.

Lá em 2013 muitos já alertavam que as redes sociais, que a cientista social Maíra Bittencourt chamou de “O Príncipe digital”, em seu livro homônimo, era uma ferramenta nova e transformaria a política para o bem ou para o mal.

O que não percebeu-se naquele momento foi que a cadela do fascismo estava no cio e seus “pitbulls” assumiam trincheiras em várias frentes: movimentos conservadores, instituições como o Judiciário, o Parlamento e o Executivo, sendo que nenhuma dessas frentes conseguiu se manter sem um forte esquema criminoso nas redes sociais.

Essa hegemonia permitiu a esse movimento criminoso constituir uma narrativa sólida contra a esquerda, movimentos libertários e temas de políticas públicas democráticas.

Isso só foi possivel porque não houve uma contra-narrativa com a mesma intensidade desse movimento, que Neon Chomsky chama, de forma muito apropriada, de proto-fascista.

Hoje se percebe uma certa “ingenuidade”, que se confunde com covardia de muitos que tem condições de fazer esse debate e não o fazem.

Em muitos casos, a treta que alguns cotidianamente realizam contra a ignorância e o mau-caratismo de membros de grupos radicais é uma luta inglória.

Muitos dos que tem as condições de ajudar no debate contra a insanidade que reina nas redes pensam em fazê-lo somente quando as condições ou oportunidades políticas estiverem dadas.

É uma atitude que não me parece em nada apropriada para a “janela de oportunidades” que temos.

Como diria Maiakóvski:

“Na primeira noite eles se aproximam

e roubam uma flor

do nosso jardim.

E não dizemos nada.

Na segunda noite, já não se escondem:

pisam as flores,

matam nosso cão,

e não dizemos nada.

Até que um dia,

o mais frágil deles

entra sozinho e nossa casa,

rouba-nos a luz e,

conhecendo nosso medo,

arranca-nos a voz da garganta.

E já não podemos dizer nada”.

Se os “outsiders” da política foram capazes de constuir sua narrativa, não será difícil para os que são da política se firmarem novamente como formadores de opinião nesse novo formato das redes.

A ferramenta do crime das fakes e suas congeneres não é uma motoserra, um revólver, uma faca, são as redes sociais, em particular o WhatsApp, com sua narrativa de morte da democracia.

Como nos lembrava Manuel Castells, antes da atual pandemia, houve uma “ruptura” na democracia de difícil solução, mas uma das formas de restabelecê-la é buscando entender a “sociedade em rede”.

Temos as ferramentas, talvez esteja faltando coragem.

Localmente, vejo com bons olhos iniciativas de lideranças buscando esse diálogo com a “sociedade em rede”, como é o caso do canal no YouTube do ex-senador Jorge Viana.

Se conseguirmos nos desprender das velhas fórmulas de comunicar, é o começo de uma alternativa.

Finalizo dizendo que há um novo mundo nas nossas retinas, que nos obrigar a mudarmos as nossas rotinas.

*Ermício Sena é doutor em Ciências Políticas e professor associado da Ufac

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