HomeOpiniãoO ataque da motosserra (versão 2020)

O ataque da motosserra (versão 2020)

Por Fábio Pontes

http://www.fabiopontes.net

O ano de 2020 começou quente na questão ambiental amazônica/acreana. Literalmente quente. Nunca antes na história desta Floresta Amazônica que aos poucos vai se transformando num sertão como apoio de nossos atuais representantes políticos, tivemos um janeiro tão quente e seco. Estamos vivendo um “inverno amazônico” com cara de “verão amazônico”. Efeito das mudanças climáticas? Ainda não podemos afirmar.

Mas a temperatura mais alta mesmo esteve no campo político e policial – sendo este último tema de outro artigo nos próximos dias. Na seara política ambiental o início de 2020 foi tomado de surpresa pela reportagem da Folha de São Paulo mostrando que a deputada federal Mara Rocha (PSDB-AC) concretizou sua promessa de apresentar projetos de lei que enfraquecem com a proteção da Amazônia no Acre.

Sua primeira iniciativa é um projeto de lei que rebaixa o Parque Nacional da Serra do Divisor para uma área de proteção ambiental, as APAS. Este rebaixamento deixaria uma das regiões que concentram a maior biodiversidade do mundo a atividades como a pecuária e agricultura de médio e grande portes e a retirada de madeira.

Desde o ano passado o blog vem alertando sobre os riscos de iniciativas legislativas como estas defendidas pela bancada da motosserra no Congresso Nacional liderada por Mara Rocha e o senador Márcio Bittar (MDB), ambos ligados ao que há de mais arcaico no setor rural acreano.

E este texto vai se ater a um vídeo produzido pelo senador bolsonarista como resposta a um produzido pelo ex-senador e ex-governador Jorge Viana (PT), no qual condena a proposta de acabar com o Parque Nacional da Serra do Divisor. Como desconhece a região do Vale do Juruá – onde está a unidade de proteção integral – e boa parte do Acre, Bittar concentrou sua fala à Reserva Extrativista Chico Mendes, área em que seus apoiadores (os grandes fazendeiros) têm muito interesse. 

Márcio Bittar (MDB) em seu vídeo de resposta ao ex-governador Jorge Viana (PT) emite algumas mentiras sobre a Resex Chico Mendes. Primeiro, que quem criou a unidade de conservação federal não foram os petistas. A Resex foi criada em março de 1990 por decreto do então presidente da República José Sarney, do MDB.

Segundo, que as famílias que ali moram estão em situação de miséria. Nestes anos que por ali tenho andado (ao contrário de Bittar frequentemente vou à reserva) nunca encontrei situação de miséria. Os moradores têm suas casas, veículos (carrou e/ou moto) o roçado, o pasto para o boi e, de quebra, a floresta para tirar a castanha e o látex.

Portanto, as famílias da Resex Chico Mendes dispõem de variadas alternativas econômicas, que lhes permitem ter uma certa qualidade de vida. Agora, se para Bittar ser miserável é não ter a mesma fazenda gigante e o gado de que ele era dono até bem pouco tempo atrás em Sena Madureira, então, sim, as famílias vivem na miserabilidade.

Outro blefe é dizer que os governos do PT colocaram dentro da Resex Chico Mendes, “quase que lacradas”. Quanto desconhecimento da história do Acre, senador. Logo o senhor que fez uma Ead em História e foi militante do extinto Partido Comunista Brasileiro, o “partidão”.

A unidade foi criada com as famílias que já estavam dentro da floresta lutando contra a destruição desta mesma floresta por pessoas que, como o senhor e sua família, chegavam ao Acre nas décadas de 1970 e 1980 para colocar boi no lugar da Amazônia.

Ninguém é obrigado a estar  dentro da reserva. Como qualquer cidadão brasileiro, eles têm o direito constitucional de lá saírem quando bem entenderem. Mário Bittar mostrou desconhecimento também com o Parque Nacional da Serra do Divisor – o que não é de estranhar ante suas frequentes ausências do Acre. Apesar de defender que as famílias que lá moram possam desenvolver atividades econômicas para sair de uma possível miséria, ele não soube apontar quais.
 Segundo o senador, “dizem que por lá tem pedras”.

Tanto Márcio Bittar quanto Mara Rocha desconhecem o “Acre profundo”. Fazem parte de uma elite rural que não conhece o modo de vida tradicional dos povos da floresta. Para eles, árvore boa é árvore no chão pegando fogo para virar, depois, virar pasto. E seus mandatos estão voltados justamente neste sentido. 

Márcio Bittar e Mara Rocha não receberam em seus gabinetes para tratar da proposta de reduzir o tamanho da Resex Chico Mendes os pequenos seringueiros, líderes comunitários, presidente de associações, mas os maiores desmatadores e criadores de gado dentro da unidade. Eles não têm a capacidade de dialogar com quem de fato está na base. São obsoletos em criticar uma tal “florestania”, e não têm a capacidade de propor alternativas econômicas sustentáveis para as populações da floresta.

Como se vê, 2020 caminha para ser um ano tão perigoso quanto foi 2019 para a sobrevivência da Amazônia. A sociedade precisa estar atenta a todas as movimentações da bancada da motosserra.  

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