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MORO X BOLSONARO: O XEQUE-MATE NÃO ESTÁ LONGE

Por André Kamai

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Na nova crise política que se instalou no coração do poder federal, com a saída de Sérgio Moro do Governo Bolsonaro, uma questão chama a atenção: como sempre fez, os movimentos do ex-ministro vêm sendo minuciosamente calculados, jamais aleatórios. Essa, portanto, é uma crise sob seu comando, a exemplo de tantas outras que orquestrou quando juiz da Lava-Jato.

Vaidoso e ganancioso, Moro sempre agiu de forma organizada e articulada, preparando o terreno para seu próximo passo. Não seria diferente nessa ruptura estratégica com Bolsonaro e sua trupe.

Quem acompanhou os desdobramentos da Lava-Jato conhece seu modus-operandis. Ficamos sabendo, graças aos jornalistas do The Intercept, que o então juiz, junto com o MPF e a Polícia Federal, por exemplo, praticavam conscientes ilegalidades. Ações coordenadas e detalhadamente calculadas encaminhavam um processo com sentença pronta antes de qualquer julgamento, num festival de conduções coercitivas e prisões temporárias jamais visto desde o fim da ditadura militar.

Aliás, a diferença entre os dois períodos é que os delatores na ditadura abriam o bico para salvar suas vidas. Já na Vara Federal de Curitiba, os prêmios para delatores que incluíssem a palavra “Lula” em seus depoimentos eram a liberdade e o desbloqueio de gordas contas bancárias. Contra a democracia e a esquerda, até a tortura se modernizou no Brasil!

É importante lembrar que esse festival de ilegalidades se sustentou num amplo apoio popular construído pela mídia corporativa por meio de uma cobertura jornalística intensa, direcionada e parcial. Vimos uma infinidade de manchetes e horas de Jornal Nacional e Fantástico, por exemplo, dedicadas à construção de um cenário em que Dilma, Lula, PT e a esquerda eram o mal a ser combatido. Ora, como sempre, Moro preparou a cena antes de se mexer.

Em 2019, Moro abandonou a magistratura e definitivamente assumiu sua face política ao compor o governo que havia ajudado a eleger, quando condenou e prendeu Lula. Nesse momento, Bolsonaro cumpriu seu pior acordo. A sabedoria política ensina que nunca se deve contratar quem não se pode demitir, mesmo que seja sua melhor opção. O presidente eleito colocou para dentro de sua equipe aquele que, de fora, destruiu o governo anterior com uma fraude – e que não hesitaria em destruir o seu, como vemos agora.

No último 24 de abril, em meio à pandemia do coronavirus, Sérgio Moro desembarcou do Governo fazendo, no bom estilo lavajatesco, uma pré delação sobre o que já sabia que em breve viria à tona. Em coletiva de imprensa, denunciou que o presidente da República tentava uma intervenção política visando aparelhar a Polícia Federal no intuito de proteger seus filhos e aliados políticos, alvos de investigações no Rio de Janeiro. E, para não fugir ao seu próprio método, Moro vazou mensagens de whatsapp ao Jornal Nacional como prova do que havia dito. Era a retomada da velha e produtiva aliança.

Em seguida, numa tentativa de resposta, Bolsonaro fez um discurso evasivo, confuso e se vitimizado. Estranhamente, com “prudência”, mediu bem as palavras. Não vimos ali aquele capitão bravateiro e esbaforido de outrora. Falou de amenidades como masculinidade do filho mais novo, relembrou os crimes da sogra e da avó de sua esposa, passou recibo sobre o assassinato de Marielle Franco e revelou que desejava que a Polícia Federal produzisse um mandante para a suposta tentativa de homicídio que sofreu durante a campanha. Falou, falou, falou e não disse nada sobre as denúncias de Moro. Ele não sabia o que vinha pela frente, mas, temia que o “cometa” fosse grande.

Diante das revelações de Sérgio Moro, o STF, impediu que Bolsonaro nomeasse um amigo particular de seus filhos para a direção geral da PF e, atendendo pedido do Procurador Geral da República, Augusto Aras, autorizou abertura de inquérito. Menos de uma semana depois das denúncias, o ex-ministro já estava depondo na Polícia Federal de Curitiba para aprofundar e detalhar o que dissera na coletiva de imprensa. Mais uma vez Moro mostrou sua capacidade de ver toda a viagem, enquanto alguns só viam onde a vista alcança.

Nesse depoimento, Moro claramente teve o objetivo de tirar de si a acusação de denunciação caluniosa e a responsabilidade de figurar como denunciante. Foram oito horas de depoimento. Os que esperavam o tal cometa destruidor ficaram frustrados. Os que temiam o asteroide, feito pombo num tabuleiro de xadrez, encheram o peito, bateram as asas, derrubaram as peças e saíram cantando vitória. Mal sabiam eles que o jogo havia sido armado na mesa do delegado da PF em Curitiba.

Por 15 meses, o então “super-ministro” da Justiça esteve no comando de toda estrutura de inteligência e segurança pública do país. Tinha sob seu controle a Polícia Federal, com Maurício Valeixo, seu fiel escudeiro no período da Lava-Jato, como diretor-geral. Nessa condição, Sérgio Moro teve acesso a todo tipo de informação, inclusive, sobre as peripercias do 01, 02 e 03 (filhos do presidente) no Rio de Janeiro – o Calcanhar de Aquiles de Bolsonaro.

Naquele longo e pífio depoimento, regado a pizza e coca-cola, Sérgio Moro tirou o corpo fora e deu à Polícia Federal todos os caminhos para investigar Bolsonaro, seus filhos e amigos. E o primeiro deles, o vídeo da bizarra reunião ministerial em que Bolsonaro diz: “não vou esperar foder todo mundo da minha família. Troco todo mundo”, se referindo a direção da PF em Brasilia, no Rio de Janeiro e ao próprio ministro da Justiça. Conversa revelada por fontes que acompanharam a exibição da gravação da reunião no STF e que comprova a veracidade das denúncias feitas pelo ex-ministro. Como visto, tudo devidamente calculado por Moro.

Muitas outras pistas estão no depoimento. Outras provavelmente não constam lá. Mas, certamente já estão sob posse da Polícia Federal da República Lavajatista de Curitiba. Pelo que parece, o cometa não virá, mas, é bom o clã Bolsonaro se preparar para uma chuva de asteroides.
O xeque-mate não está longe!

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